sábado, 23 de abril de 2011

Não sei distinguir no céu as várias constelações



Não sei distinguir no céu as várias constelações:
não sei os nomes de todos os peixes e flores,
nem dos rios nem das montanhas:
caminho por entre secretas coisas,
a cada lugar em que meus olhos pousam,
minha boca dirige uma pergunta.


Não sei o nome de todos os habitantes do mundo.
nem verei jamais todos os seus rostos,
embora sejam meus contemporâneos.


Não, não sei, na verdade, como são em corpo e alma
todos os meus amigos e parentes.
Não entendo todas as coisas que dizem,
não compreendo bem de que vivem, como vivem,
como pensam que estão vivendo.


Não me conheço completamente,
só nos espelhos me encontro,
tenho muita pena de mim.


Não penso todos os dias exatamente
do mesmo modo.
As mesmas coisas me parecem a cada instante diversas.
Amo e desamo, sofro e deixo de sofrer,
ao mesmo tempo, nas mesmas circunstâncias.


Aprendo e desaprendo,
esqueço e lembro,
meu Deus, que águas são estas onde vivo,
que ondulam em mim, dentro e fora de mim?


Se dizem meu nome, atendo por hábito.
Que nome é o meu?
Ignoro tudo.


Quando alguém diz que sabe alguma coisa,
fico perplexa:
ou estará enganado, ou é um farsante
- ou somente eu ignoro e me ignoro desta maneira?


E os homens combatem pelo que julgam saber.
E eu, que estudo tanto,
inclino a cabeça sem ilusões,
e a minha ignorância enche-me de lágrimas as mãos.


1960
Cecília Meireles
In: O Estudante Empírico (1959-1964)

sexta-feira, 8 de abril de 2011

O Homem Pós-Moderno

O termo pós-modernidade tem sido usado a fim de designar uma nova condição histórica, ulterior à Moderna. Contudo, quando se dá o término da Idade Moderna e inicia-se a subsequente?
Desde sua primeira aplicação até os dias hodiernos, o conceito “pós-modernidade” tem gerado inúmeras controvérsias. Quem primeiro fez uso e expandiu tal conceito foi o filósofo francês Jean-François Lyotard, na obra “A Condição Pós-Modernidade” (1979). Segundo o autor, a pós-modernidade é sublinhada como “o fim de uma tradição de mudança e ruptura”.
Consideramos, então, esse “fim” sobretudo a década de 1960: anos em que se findam os movimentos de contracultura, nos quais a juventude se comportava de maneira arbitrária aos valores estabelecidos pela sociedade. E principia-se um novo estilo de capitalismo, uma vez que as máquinas (indústrias) deram lugar às “máquinas de imagens”, a saber, televisão, computador, internet, isto é, à Era digital - por enquanto dependente da mão-de-obra humana.
E, hoje, ao analisarmos o prefixo “pós”, constatamos que seu emprego tem caráter mais de amaldiçoar a modernidade do que de elaborar algo novo a partir dela. Isto se justifica pelo fato de, na Modernidade, depararmo-nos com acontecimentos tão penosos à humanidade, como, por exemplo, as duas guerras mundiais, Aushwitz e Hiroshima. Centrado nestes atentados, o homem pós-moderno, ainda, prende-se ao passado e não se lança, outra vez mais, ao desconhecido, à conquista do novo.
      Resta-nos, enfim, avaliar nossas preocupações, reflexões e anseios para que, assim, saibamos se continuamos a viver o ciclo repetitivo de “exorcizar” a Modernidade, ou se ensejamos viver a pós-modernidade com suas implicações e contingências abstrusas.